Todo dia ela faz tudo sempre igual.
Programa o despertador para meia hora antes do necessário só pelo prazer de ignorá-lo algumas vezes antes de se levantar. Em função disso, perde a hora quase sempre. Toma banho correndo, toma café da manhã em pé, ainda se arrumando, e sai. Correndo.
Só que dessa vez, ela foi longe demais. Desistiu, em cima da hora, de ir com uns amigos de carro, porque se atrasou. Tudo bem ela não ir, mas podia ter avisado com um pouco mais de antecedência. Ela não fez por mal. Na verdade, pensou em não atrapalhar, por isso a recusa. Mas, de alguma forma, o tiro saiu pela culatra.
Os amigos relevaram, mas não gostaram muito. Conversaram e se entenderam, mas por telefone as coisas parecem não ficar muito bem claras. Ela pretende terminar de resolver essa história depois. Frente a frente. Para não restar má impressão.
Saiu de casa com algum tempo de atraso e foi para o trabalho. Ninguém reparará a uma hora a menos que ela pretende trabalhar hoje. Ninguém precisa controlá-la. Ela sabe o que faz. E muito bem. Por vezes é até arrogante o seu jeito de pensar assim. Mas isso ela nunca mudou. E, pelo visto, nem vai mudar.
Ela vive de fases complicadas. A da vez é não conter impulsos e fazer coisas das quais, na maioria das vezes, se arrepende depois. Seu melhor amigo lhe puxou as orelhas nos últimos dias. Disse que ela precisava melhorar o jeito impetuoso e impulsivo. Ela diz que tenta, mas não é de todo verdade. Algumas características, ela simplesmente ignora ter. Mas as tem.
Chegou no trabalho como quem quer ir embora. Deu bom dia, sorriu, foi educada como sempre. Recebeu sua lista de tarefas, ligou o computador e começou a executá-las. Irritou-se. O excesso de tecnologia ao qual sempre fora avessa a atrapalha mais uma vez. E ela não tem paciência para essas coisas. Nunca teve.
Decidiu sair para tomar um café e, ao abrir a carteira, descobriu que esquecera os documentos em casa. Tinha uma entrevista impostantíssima depois do almoço e temia não poder comparecer. Preferiu arriscar. Dona de si como só ela, não ia dar o braço a torcer. Mesmo que, cansada, tenha pensado em desistir. Deixou-se vencer pelo outro cansaço, o da mesmice. Ela adora rotina. Mas detesta repetição. Detesta ver-se presa a laços que não cultiva. Sempre veste a camisa de tudo a que se propõe. Mas nem sempre amor e dedicação andam juntos. Ela quer sempre mais, sempre o máximo de tudo o que faz. Para ser bem sucedida, precisa ter tesão pela rotina que segue. E por mais que goste do ambiente, das pessoas e do trabalho atual, ainda não se sente completa. Precisa de mais.
Seguiu sua insossa rotina de lutar com a máquina à sua frente. Ainda não venceu. Não dessa vez. Mas descobriu, num canal direto de comunicação, que hoje é o dia do sorvete. Sua face se iluminou. Todo o estresse que ela ainda carregava consigo, mesmo que ainda pesasse, já não era mais seu foco. Mais do que nunca, olhava o relógio desesperadamente a cada minuto. Contando os segundos para o término de sua jornada. Ainda nem almoçara, mas já contava com a sobremesa. O sistema continuava travado, a coluna continuava doendo e a paciência ainda não tinha voltado. Ela ainda contava com o medo de tudo dar errado. Mas uma certeza a mantinha ali. Nem a pré-estréia a que fora convidada parecia tão importante.
A esperança, mesmo que boba, de tomar um sorvete ao final do dia dissipava toda e qualquer falta de ânimo que passasse pela sua cabeça.
7 comentários:
\o/
Fiz sozinha!!!
Sem Morena. Eu juro!
huahuahua
Eu simplesmente me vi falando td isso, T U D O ! ! !
Amei!!!
Ahhh....por isso que você queria sorvete! heuaehiuaehaeuihaeuiheaiuaehu
É por isso que eu digo que sorvete muda as pessoas. A segunda Guerra mundial não teria acontecido se Hitler tivesse tomado sorvete. Aparentemente isso sujaria o bigodinho dele. Bem, cada um com o seu bigode (ou com o seu sorvete), sei lá... tanto faz
Ahh que delícia de conto, Rê!
Senti você aqui do meu lado, comendo um sorvetão de morango que combinava com seu cabelo :)
OBS: Apoio o autoconhecimento, mas acho que você é muito dura consigo mesma as vezes...
Sessão de terapia...
hahaha
É, pois é...
e muitas pessoas ignoram o poder terapêutico de um belo sorvete de morango!!!
Às vezes ele serve pra passar o tempo depois de um belo show, fazendo hora pra ir pra casa; às vezes pra esquecer o dia em que tudo dá errado; às vezes pra deixar as pessoas gripadas...
Mas sorvete é sempre sorvete... e viva o 23 de setembro, o Dia Intergaláctico do sorvete (de morango!!! =P)
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